Resenha do documentário “A Raça Humana”

  1. Referência bibliográfica
[Documentário "raça humana" revela bastidores das cotas_raciais_na_unb._Disponível_em_https://www.youtube.com/watch?v=y_dbLLBPXLo. Acesso em 20 de Abr. de 2015].




O documentário é uma produção que instiga o debate sobre a política de cotas em universidades públicas. O vídeo é uma montagem com cortes de diferentes eventos. A direção e roteiro do vídeo são de Dulce Queiroz e a produção é de Pedro Henrique Sassi e Pedro Caetano. No documentário há basicamente duas posturas em relação a política de cotas raciais e que são confrontadas em debate: os que se declaram a favor das cotas e os que se declaram contra. Um e outro tentam justificar suas opiniões e posturas, mas em torno do acalorado debate há um retorno às discussões sobre raça (termo já em desuso nos meios científicos).
O processo seletivo da Universidade de Brasília (UnB) aderiu ao sistema de cotas raciais desde o ano de 2004. Das vagas ofertadas, 20% se destinam aos afrodescendentes. A medida é polêmica e divide a opinião de várias pessoas. A questão está longe de ser um consenso e no ano de 2009 o partido político DEM pediu o fim das cotas raciais, os conflitos se intensificaram e houve interferência do Supremo Tribunal Federal. No documentário é possível vislumbrar diferentes posicionamentos sobre a política de cotas nas universidades brasileiras. Desse modo, reúne o comentário de diferentes especialistas e áreas como, por exemplo, representantes de direito constitucional, da área de bioquímica médica, co-autor do projeto de cotas da UnB. O assunto não segue uma única linha de raciocínio, o que contribui para relativizar os argumentos. Assim, o tema é explorado por estudantes, professores, reitoria, políticos e representantes de grupos afrodescendentes.
A discussão no vídeo sobre a política de cotas nas universidades traz à luz velhas questões sobre preconceito, reparação histórica, políticas afirmativas, etc. não exigindo conhecimento prévio sobre o tema, no entanto fomenta no telespectador um posicionamento sobre a temática. Embora o debate sobre a abertura de propostas de educação para a população negra no Brasil, tenha sido o pontapé inicial para alargar as discussões, não há uma conclusão final sobre o assunto, ficando a discussão aberta para suscitar novos debates mesmo após a expansão do sistema de cotas por mais de 90 instituições de ensino desde o ano de 2009. Mesmo se tratando de um documentário que não apresente uma conclusão definitiva, no final do trabalho há comemorações dos avanços políticos que são comemorados pelos grupos defensores das cotas em meio às articulações de ideias e lutas.
O modelo teórico indicado no documentário faz menção a discussões anteriores sobre o tema, dentro e fora da universidade. O estado de problemas que o tema envolve rediscute a racialização e igualdade racial, características fenotípicas, autonomia das universidades e outros temas que são referenciados no documentário. No caso específico da UnB, o contexto de discussão foi ambientado nas reações sobre o caso do estudante Ari, que em 1999 conseguiu ingressar no programa de doutorado em Antropologia da universidade como o primeiro aluno negro a alcançar essa faceta nos últimos 20 anos – o caso teve grande repercussão nacional.
O procedimento encontrado para discutir a questão racial foi a produção audiovisual de diferentes eventos que perpassa desde as discussões acadêmicas, a publicação do livro do sociólogo Demétrio Magnoli, as posições políticas de deputados(as) e aprovação do Estatuto da igualdade racial. O documentário se propõe a ser um canal de divulgação no contexto das discussões sobre a população negra na câmara, nas academias, nos movimentos de lutas e resistências, mas também expõe o grau de envolvimento das pessoas e instituições do país. O mérito desse tipo de mídia pode ser atribuído ao fato de desvelar o mito da democracia racial assinalando a mudança de perspectiva e também por levantar questionamentos de suposta harmonia entre negros e brancos como quer a democracia racial. Denunciam novas formas de segregação racial focalizando as desigualdades sociais entre negros e brancos. Desse modo, o documentário procura desnaturalizar o preconceito ao propor caminhos e soluções no interior das instituições assim como no cenário político por meio de implementações de leis. A criação do sistema de cotas é parte de uma política afirmativa com vistas a incluir considerável parcela da população brasileira que historicamente não tiveram a mesma igualdade de oportunidades, pois como se sabe a Lei áurea foi um marco sem força. A partir da revisão radical procura elucidar questionamentos e interpretações sobre o que seja povo brasileiro.

 Apesar das ideias apresentadas no vídeo configurarem problemas já bem conhecido e amplamente debatido nos meios universitários, sua abordagem se revela pertinente e inovadora. De maneira abreviada e prática o documentário discorre sobre o sistema de cotas (um tema omitido por uns e abrangido por outros), sobretudo relativizando as diferentes formas de pensamento. Há clareza e compreensão nos debates, sendo possível precisar o valor que cada um confere a temática. Também há coerência com o que o documentário se propõe a explanar desde o início do trabalho. Apresenta o conteúdo de forma equilibrada, desapaixonada e dispondo as partes envolvidas. Utiliza uma linguagem simples de fácil compreensão contribuindo para seu maior alcance de público, em geral estudantes e especialistas, mas também leigos e ativistas.

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